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segunda-feira, 14 de novembro de 2016

Um ciclone.


O ciclone chegando

Vinha rápido e decidido. Em alguns minutos, pudemos sentir as primeiras rajadas de vento da sacada de nosso quartinho, Sofia novamente em êxtase no colo do pai, eu novamente apavorada e o vento cada vez mais intenso. Foi apenas o tempo de pôr fim à festinha dos dois, entrar, fechar e trancar as portas (duas folhas, uma de madeira e outra de vidro) da varanda como havíamos sido instruídos pelos funcionários do hotel e verificar que ele não vinha para brincadeira: antes de tudo, antes mesmo que pudéssemos nos dar conta de seu poder, a energia caiu. Em um minuto, o quarto se alagou e o vento ficou tão forte que Fernando foi obrigado a segurar as portas para que elas não se abrissem. O ruído era admirável. Nesta hora eu fui tomada de desespero, pois estava no meio de um ciclone com minha filha e o que nos separava era apenas uma parede na qual eu já não confiava, dada a violência das batidas do vento contra a porta. Gritei para o Fernando que iria descer com Sofia para o hall, e que ele viesse também porque aquilo tudo iria cair. Ele ficou porque não podia soltar a porta. Depois me explicou que pôs a cama contra a porta e tirou todas as nossas coisas do chão para que não se encharcassem. Enquanto isso, de dentro da área de café da manhã do hotel, eu assistia, pelas janelas, com Sofia no colo e à distância, à violência da ventania. Foram alguns minutos apenas. Pequenas árvores em frente às janelas se sacudiam furiosamente e nada além disso se podia ver, apenas cinza. Um fenômeno perturbador. De repente toda a ventania cessou e uma forte chuva com granizo tomou conta. Essa manifestação também foi rápida, cerca de alguns minutos, ao que se seguiu uma chuva comum e familiar. Quase nada mais fazia lembrar o furor de alguns minutos atrás, a não ser a altura das águas do mar, que invadiram as ruas, e as cenas de destruição que pudemos então testemunhar. Tudo o que estava solto voou. Muito do que estava preso se desprendeu. Telhados e fachadas de estabelecimentos parcial ou completamente destruídos, objetos diversos espalhados ao redor: cadeiras, pedaços de madeira, bancos... Foram no máximo 10 minutos, mas nos transportaram com perfeição para algum desses filmes sobre catástrofes de Hollywood. 

Logo após a passagem do ciclone: o castelinho ficou parcialmente destelhado e a água do mar invadiu as ruas

Fomos obrigados a ficar lá mais um dia, não tanto pelo alerta, que supostamente duraria até quarta-feira porém cessou no dia seguinte, mas sim porque eu fiquei bastante doente do piriri e não estava apta a fazer viagens de ônibus. O Fernando também não estava bem, mas eu fiquei bem pior, me sentindo fraca e febril, fora o revertério. Nos mudaram de quarto para uma suíte interna porque havia o risco de mais ventos e chuvas fortes e alagamento do quarto. Neste dia, Sofia deu grande demonstração de resiliência e flexibilidade: resistiu tranquilamente a um dia inteiro encarcerada em um quarto de hotel apenas assistindo vídeos no youtube e brincando conosco. Nem TV ela quis assistir, porque os personagens dos desenhos “falam estranho”. Pedimos aos funcionários do hotel que deixassem eu cozinhar já que teríamos que ficar mais um dia lá e nossa filha estava há dois dias sem comer. Eles foram generosos e nos propuseram que providenciássemos os ingredientes e passássemos as receitas que eles fariam as comidas, isso seria o máximo que eles poderiam oferecer. A princípio achei que estavam sendo muito inflexíveis, mas depois que passei as receitas cuidadosamente escritas em espanhol do Google Tradutor e o resultado foi praticamente como se eu as tivesse feito, me senti agradecida por não ter tido que sair da cama para cozinhar. As receitas foram passadas em quantidade generosa para que nós também, além da Sofia, comêssemos e foi muito gostoso comer comida familiar: arroz temperado com cebola picadinha, frango amarelo com açafrão e brócolis, tudo preparado no azeite. É a comida preferida da Sofia e ela comeu muito bem, tanto no almoço quanto no jantar. No dia anterior, nem pão havia aceitado, só mamadeira.

O dia foi longo, de muitas chuvas e a noite foi inteira de ventos fortes e barulhentos. Mesmo assim conseguimos sair de lá rumo a Montevidéu. Essa foi a desoladora paisagem que deixamos para trás:



Indo em direção à rodoviária, pudemos ver mais cenas da destruição: muitos restaurantes e lojinhas destelhados e com as fachadas destruídas. Todo o comércio se encontrava fechado, a cidade parecia morta. 

Me fui com a impressão que o paraíso havia se transformado em inferno... Uma pena, porque a cidade é realmente muito charmosa.

De acordo com as notícias que encontrei, os ventos fortes do ciclone atingiram 200 km/h, passaram pelo Rio Grande do Sul com a mesma fúria e chegaram à costa do Brasil 
em forma de fortíssima ressaca no Rio de Janeiro e em Santos.


Apesar dos contratempos, andando pelas ruas, encontramos um cantinho quase perfeito para nós em Piriápolis

Sofia não curtiu muito, sentiu que ficou faltando alguma coisa...





 

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